PRIMAVERA BRASILEIRA
(17/06/2013)
A primavera chega em pleno inverno,
e à ordem em progresso causa espanto
ouvir da voz da rua o seu canto,
semente de um confronto pós-moderno.
E nada no momento (externo? interno?)
explica o movimento em seu encanto.
Por isso, gritam tantos, grito tanto,
tecendo no fugaz o ciclo eterno.
Quem despertou a bela adormecida?
Quem transformou a farsa em carnaval?
Que vozes virtuais ganharam vida?
E vamos caminhando pela rua,
no centro da avenida principal,
em frente, pois a luta continua.
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OUTSIDER
à noite no silêncio sem remédio
sozinho como a Terra no infinito
vazio sob o peso deste tédio
a voz querendo fala ou mesmo um grito
capaz de despertar alguém no prédio
que traga a luz que tanto necessito
porque me sinto tão mas tão cansado
de trafegar na mão do lado errado.
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DOIS AMANTES
Se o amor não lhe for suficiente,
que lhe seja agradável o carinho.
Vibra o corpo cedendo lentamente,
aquecido por mim e pelo vinho.
À pergunta, o que foi que deu na gente,
o que dizer em meio ao desalinho?
Já não somos apenas dois amantes;
nem os dois tão sozinhos como antes.
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CORAÇÃO DE PEDRA
De pedra o coração podia ser
Para não se entregar a esta paixão
É loucura demais tanto querer
Por alguém que se esconde na razão
Você só quer jogar para vencer
Nunca quer repartir o vinho e o pão
É sempre bom se é... para você
E para os outros resta a solidão
Não vale a pena amar assim, assim
Não dá; não faz sentido a minha dor
Por isso vou partir antes do fim
Por isso vou buscar um novo amor
E você vai pensar que eu fui ruim
Mas foi você que enfim me libertou.
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RENASCENDO
Quando o sol for aos poucos se perdendo,
E a vida que levei o for seguindo,
Que tudo seja intenso, seja lindo;
Passagem da matéria renascendo.
Breve luta em que o corpo foi cedendo.
Silêncio de um discurso sempre infindo.
E a noite com seu manto irá surgindo,
E novas ilusões virá trazendo.
Quem sabe eu cruze o espaço em movimento,
Anônimo ou vestido de cometa;
Metáfora de dor, deslumbramento;
E os versos que escrevi fiquem na Rede,
Como cartas que domem na gaveta,
Ou fotos em um quadro na parede.
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OUVIDO NO MORRO
Só porque moro ali na subida do morro
Essa gente mesquinha quer me humilhar
Dizem que sou bandido e só sei vadiar
Sou moleque, malandro; pior que cachorro
Pelas ruas eu saio, eu driblo, eu salto, eu corro,
Eu faço o meu caminho, sem poder voltar
Sou como passarinho aprendendo a voar
Se falho estou sozinho, sem dó nem socorro
Cheiro cola nas ruas, sou magro, feioso,
Não vou mais para a escola, ando atrás de um trocado,
Vivo em banco de praça, em lugar perigoso
Quando a corda arrebenta é sempre do meu lado
Porque fica mais fácil, menos doloroso,
Condenar quem pecou a quem fez o pecado.
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QUESTÕES NÃO RESOLVIDAS
(ou A Lanterna de Diógenes)
Somos seres: sujeitos ou objetos?
Transitamos nas mesmas avenidas
Entre vozes perenes, esquecidas...
E nos sentimos frágeis e incompletos.
Temos - em diferentes alfabetos -
Questões que nunca foram resolvidas:
Sublimamos os sonhos com mordidas
E enganamos a fome com projetos.
Se pudéssemos ler nas entrelinhas
Quanta coisa pequena nos governa:
Obras menores, lógicas mesquinhas...
É tempo de pensar novas propostas.
De carregar na mão uma lanterna,
E de propor perguntas e respostas.
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ANO NOVO DE VERDADE
Venha novo, mas novo de verdade,
Sem medo de que possa machucá-lo;
Venha novo, e que seja breve estalo
Na passagem do tempo. Sem saudade.
Venha novo, por ser ato, vontade,
Mas que cause a surpresa de um regalo;
Venha novo, maior (sonho que embalo),
Em busca de justiça e liberdade.
Um Ano Novo, assim, tão desejado,
Que lhe traga prazeres e delícias;
Este Ano Novo existe, bem guardado;
Mas tudo são apenas esperanças.
Melhor que as tenha. Ou então: cobice-as;
Pois elas só começam com mudanças.
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JESUS E O NATAL
O dia raiou
Repleto de luz
Pois nele, Senhor,
Nasceu o Jesus
O filho de Deus
Do povo também
No meio dos seus
Da pobre Belém
Menino sofreu
A dura opressão
Mas nunca perdeu
O seu coração
E soube brincar
E soube aprender
A compartilhar
Amor e saber
Depois semeou
Palavras de fé
Pescou pescador
Falou à mulher
Pregou que ninguém
Sozinho será
Em Jerusalém
Em qualquer lugar
E trouxe esperança
Falando de paz
De amor à criança
De glórias reais
Na ceia sagrada
Do vinho e do pão
Lá foi proclamada
A nova união
E não se curvou
Aos donos das leis
Até perdoou
Ao judas soez
Rezando pediu
Perdão para Deus
Ao ódio febril
Dos maus fariseus
Queriam na cruz
Calar sua voz
Mas eis que Jesus
Renasce entre nós
A cada manhã
A cada Natal
Na prece cristã
No eterno sinal.
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Em homenagem ao grande poeta e tradutor Ivan Junqueira, que morreu no dia 3 de julho de 2014, publico este belo poema do livro "O Grifo":
MORRER
Pois morrer é apenas isto:
cerrar os olhos vazios
e esquecer o que foi visto;
é não supor-se infinito,
mas antes fáustico e ambíguo,
jogral entre a história e o mito;
é despedir-se em surdina,
sem epitáfio melífluo
ou testamento sovina;
é talvez como despir
o que em vida não vestia
e agora é inútil vestir;
é nada deixar aqui:
memória, pecúlio, estirpe,
sequer um traço de si;
é findar-se como um círio
em cuja luz tudo expira
sem êxtase nem martírio.
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